ao longo da avenida
"O tempo das suaves raparigas / é junto ao mar ao longo da avenida" - Ruy Belo
quarta-feira, maio 12
não, tiago, não concordo contigo. eu acredito no diálogo ecuménico. porque o vi na prática. incompleto, inacabado mas a funcionar. sem perfeição de qualquer espécie, como nós. mas a silenciar as desavenças dos que se dizem cristãos. estás convidado, no final de 2004, a seres testemunha dessa alegria.
domingo, maio 9
questões sem importância
onde é que errei, princesa? por que avenidas me perdi sem saber o que fazer? em que ilusões bebi este desalento? porque é que a vida sem ti custa tanto?
sexta-feira, maio 7
na companhia de djavan
a noite está quase a passar. porque estás tão longe?
"Oceano
Assim que o dia amanheceu
Lá no mar alto da paixão
Dava prá ver o tempo ruir
Cadê você, que solidão
Esquecerá de mim
Enfim, de tudo que há na terra
Não há nada em lugar nenhum
Que vá crescer sem você chegar
Longe de ti tudo parou
Ninguém sabe o que eu sofri
Amar é um deserto e seus temores
Vida que vai na sela dessas dores
Não sabe voltar, me dá teu calor
Vem me fazer feliz porque eu te amo
Você deságua em mim e eu oceano
Esqueço que amar é quase uma dor
Só sei viver se for por você"
porque estou aqui
é da tua voz que eu preciso para perceber como ainda vives em mim. e mesmo longe só tu me poderias deixar dez minutos a pensar o que faço aqui. para depois respirar fundo. e não sair do mesmo sítio.
não me deixes adormecer
a música do múm são pequenas e frágeis festas nas faces dos homens crescidos. são sinos que nos embalam. uma voz delicada que nos sopra ao ouvido: dorme...
é por isso que, mesmo depois da vida nos acolher e nos dizer palavras estranhas, continuamos a sonhar. como se ainda fôssemos crianças que vêem no escuro os monstros que não existem.
e apetece pular da cama. correr muito, muito até ao mar. onde apenas os faróis nos guiam para que a cidade não nos engula.
bons sonhos, dorme feliz...
quarta-feira, maio 5
retratos da bahia III - adilton
quantos anos você tem? dezoito. ah, seu mentiroso, diz quantos anos você tem. dezoito. (adilton sorri com os seus dentes esquisitos, baixinho e gordinho, com um sorriso delicioso. adilton não pede, ele é guia turístico) vocês dão o que quiserem no final. quanto tempo demora uma volta no pelourinho? uns quarenta minutos. se vocês pararem para fazer compras ou visitar museus demora mais. mas eu espero por vocês. onde podemos apanhar um táxi? aqui mesmo (na entrada superior do elevador lacerda, de fronte para a baía de todos os santos que banha a terra da alegria, das 365 igrejas) mas negocia primeiro. eu fico por aqui. adeus adilton. (mais à noite no largo do pelourinho, adilton vem acompanhando um casal de turistas e passado pouco tempo já está sentado do nosso lado) fiquei esperando por vocês... não, não pode. nós não prometemos nada... (adilton sorri sempre, está cansado. fala um português correcto e sabe tudo de salvador. sabe bem quem nós somos, de que país vimos) vocês gostam de reggae? sim. mas não entra nesse bar não que eles colocam droga na bebida para você ficar doido. (adilton ainda oferece um mapa e mais duas ou três doses de simpatia e doçura. senti-me protegido por aquele corpo pouco desenvolvido. pelos seus olhos grandes. pela alegria de amar a bahia e de não ter nada, mas dar tudo) até terça, adilton. p'rá terça da bênção. adeus. bom jantar no boi preto. vocês são portugueses, podem pagar. adeus. (sorri por último, adeus adilton)
porque sorrimos
quando a vida não sorri?
domingo, maio 2
retratos da bahia II - nilton fernandes
você toca elis regina? claro, claro. (com a guitarra, sentado num banco alto à porta do restaurante "encontro dos artistas") música simples vocês sabem, eu gosto assim de viajar. escutar os pedidos das pessoas e tocar o que eu sei. prefiro isso a tocar só o que eu gosto. gravei há pouco meu primeiro álbum, se chama "simples", como a música que toco. (ébrio, outra pessoa se senta e pede) toca algo do djavan. um samba daqueles mais recentes. mas só se quiser. claro, toco já. (paulo mata, pianista de jazz, paulista, já tocou no hot clube de lisboa. falamos de lisboa, da fraude que foi e é filipão, do seu preconceito em conhecer lisboa e a da sua paixão depois de ver o seu amanhecer) (nilton não pára de tocar. pede uma cola que fica esquentando) você sabe, se agora bebesse a cola fria era um abraço na goela. (nilton toca, toca, toca, até as lágrimas quase se derramarem nas pedra irregulares daquela rua do pelô, numa noite quente da bahia)
sábado, maio 1
retratos da bahia I - márcio
você anda na escola? ando. em que ano? oi... em que classe? ah, na segunda. meu pai foi morto em s. paulo e eu tenho de ajudar minha mãe e meus dois irmãos. (márcio tem uma carapinha imponente, meio queimada pelo sol e uma caixa pesada de madeira com o seu material de engraxador) quanto você leva por cada trabalho? depende... hoje só fiz dois reais porque estava chovendo. (márcio retira as notas amachucadas do bolso sem nunca pedir nada. simplesmente sorri. sentou-se também um pouco para descansar) você gosta de andar na escola? gosto. ouve uma coisa: não troca nunca os livros pela caixa de madeira. é só para ajudar minha mãe. quando você se vai deitar? quando tiver dinheiro para o café da manhã. você entra a que horas na escola? às oito, até às onze. e depois? vou trabalhar para o pelô engraxar sapato. estuda muito márcio.
sexta-feira, abril 30
always obey pai mei
tarantino confirma porque é um génio. conhecedor profundo do imaginário americano, glorifica-o ridicularizando-o. vol. 2 é mais do mesmo, mas melhor. mais refinado, mais sórdido, mais realista. tocando no coração e na espada afiada ao mesmo tempo. é voltar ao templo de shaolin sem sair do deserto de el paso ou visitar um bordel mexicano (pleno de guitarradas) sem esquecer os cinco pontos de pressão no coração, de pai mei. a noiva reconcilia-se com a vida e ri. ri muito. sabemos porque ri?
porque tarantino toca na essência de uma américa imaginada. recriada por assassinos sem escrúpulos mas que ama os seus filhos como ninguém. méxico e oriente são os dois azimutes de uma cultura que quer fugir ficando. ou melhor, sonhando. e tarantino faz-nos sonhar.
quarta-feira, abril 28
tudo passou definitivamente
"As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir
Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir
São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder
Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer
A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera
Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera
A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade"
chuva - mariza
tão perto do farol
tão perto do farol da praia do forte e da
aldeia de pescadores sentado numa rocha
molho os pés com a certeza absoluta de que
eles são os meus pés e não a poesia
estes quadros incompletos de palavras incertas
que hesito em juntar ou que mesmo
arruino sem saber bem o que fazer
com tanto sol e areia e visões e canções
de versos longos e belos
e conversas que parecem não querer terminar
nem mesmo quando o sol se põe e a vida
se suspende diante da noite e das luzes ténues
tão perto do farol olho o mar
e sei que se fosse razoável ou mesmo
possível nadar até ao outro lado
como o escravo que amava alina e que morreu
na bahia de todos os santos
tu não me esperavas
tão perto do farol eu sei porque tudo
continua igual
porque a grandeza do mar
ou a vida
me permite pensar que contigo fui feliz
enquanto houver mar o teu nome
terá o sabor do sal
ingenuamente eu sei
mas amando
e sem palavras certas
não sei fazer mais que te amar
segunda-feira, abril 26
os namorados
amanhece na bahia enquanto ouço "chega de saudade"
sons suavemente delicados que dão cor ao sol
que brilha lá no alto com a força de um verão
que teima em não terminar nunca ou mesmo
que parece perpetuar essa dança tão sensual dos
namorados palavras trocadas em surdina um
ou dois beijos repentinos na boca e no rosto
pele húmida que reflecte a natureza da vida
dos homens e mulheres que amam sem espaço
para que o silêncio ou o egoísmo se levantem
como uma nuvem que cobre o céu e o sol
lembras-te de mim das coisas que te quis dizer
lembras-te dos silêncios amor dessas linhas
que deixámos em branco para que os pássaros
pudessem falar ao entardecer da poesia que não
soubemos escrever das coisas que esquecemos depois
a recordação do vazio do que ficou por fazer
dos abraços ternos
o que são agora?
(não faz mais sentido
chorar se apenas fomos namorados longe da bahia)
sexta-feira, abril 23
um breve diálogo ao som da poesia de vinicius
"- porque é que não consegues apaixonar-te?
- porque ainda te amo.
- mas quantos lugares tens no coração?
- apenas o teu.
- e achas isso possível?
- diz-me tu... ele é teu."
quarta-feira, abril 21
largo do pelourinho, salvador da bahia
é este o coração de uma áfrica transplantada há 500 anos. o essencial manteve-se. a música, os rostos, o ritmo, o calor.
mas naquelas escadas também me lembrei de ti.
segunda-feira, abril 19
poema da batucada
há muitos lugares por percorrer na
minha alma e na tua rua
que nunca visitei
mas aqui na praia do forte
ao som do forró do nordeste
enquanto suo e chove uma
água tropical que silencia o
canto agreste dos pavões
penso
que este era apenas o
único lugar
(porque é aqui que sou)
onde a tua presença ou
na realidade a tua ausência
faz sentido
queria apenas ir junto do mar
dizer baixinho ao luar
como gosto do teu sorriso
e como a recordação dos teus
lábios me lança subitamente
na comunhão mais profunda
com a chuva que cai
apesar de não verter uma lágrima
e tu não estares aqui
domingo, abril 18
poema a uma baiana
como é difícil descrever o teu rosto
entrevisto por entre os pares que
dançavam o forró no aeroclube
jardim de alah um pouco antes de itapuã
de cabelo apanhado você sorria
e eu não sabia o que fazer
se me apaixonar a noite será
longa demais se fechar os olhos
não saberei quem sou
perdido no calor húmido da
bahia
viajante perdido dessa lisboa
triste que você decerto não
conhece
eu não te conheço mas
reconheço o teu olhar agora
e o reconheceria em qualquer
lugar onde fosse feliz
porque apesar de tudo sei que
o nosso caminho é um
trilho comum
(você olha discretamente em
busca de seu amor e eu
não sei onde está o meu)
quando jamais a minha
vida amanhecer quero morrer
contigo na bahia
e dançar até o dia chegar
de mansinho trazendo esse
sol redentor que brilha na
sua pele doce
quer vir?
sexta-feira, abril 9
amanhã, este é o meu destino
feliz páscoa. a avenida regressa daqui a uma semana. com os sabores do brasil. e muitas casas para erguer.
terça-feira, abril 6
nos 10 anos da morte de kurt cobain
dói-me o estômago. o kurt sofria do mesmo. cronicamente. por isso procurava um refúgio que lhe havia de ser fatal.
nunca esquecerei uma tarde que passei a ouvir na rádio uma homenagem no primeiro aniversário da sua morte. eram tempos onde falávamos da morte. do seu olhar triste. do nossos olhares conformados a uma vida sem saída aparente. mas os nirvana acabaram e a vida continuou. apesar da nossa tristeza.
carta
é na doença que os meus sentidos ficam susceptíveis de serem violados pela tua recordação. como uma carta que nunca escrevi e que agora construo sílaba por sílaba enquanto o meu corpo sofre.
"Desculpa se te fiz fogo e noite
sem pedir autorização por escrito
ao sindicato dos Deuses...
mas não fui eu que te escolhi.
Desculpa se te usei
como refúgio dos meus sentidos
pedaço de silêncios perdidos
que voltei a encontrar em ti..."
toranja
sexta-feira, abril 2
das janelas dos comboios
quando ia com a minha mãe a lisboa, de mão dada, atento e ingénuo, tão pequeno como só as crianças o conseguem ser, o lugar da janela era sempre meu. ir à janela continua hoje a ser apenas uma forma de deixar que o olhar se prolongue para além de mim. e perco-me. nas luzes da noite ou banhado pelo sol. esqueço-me da minha estação.
de que serve viajar sem ver o espaço que ocupa o tempo. mesmo quando conhecemos de cor o percurso, a liberdade está no olhar e não no corpo preso a uma carruagem fria que se move sem eu querer.
quinta-feira, abril 1
falámos no caminho
e durante o silêncio
olhei mais uma ou duas vezes para ti
sem dares por nada
sem reparares nos meus lábios a sorrir
para quê?
depois olhei pela janela
a tarde morria lentamente
as árvores cruzavam o teu olhar
demasiado longe daqui
terça-feira, março 30
sobre o novo livro de saramago
sei que isto não se faz. falar de uma coisa sem a conhecermos. mas, por acaso, este é daqueles livros de que por tanto se falar me parece já o ter lido sem o realmente ter feito.
o intróito serve apenas para dizer que também hoje me converto a uma certa blogosfera cujo labor se centra na própria blogosfera. pois, vou falar de outro blog.
Através do tiago conheci um interessante blog do qual retiro estas sábias palavras (entre outras que também aconselho), que, amavelmente, faço minhas:
"Nem tudo o sara é mágico
Ouvir Saramago a dizer baboseiras em directo, dando aquele ar de que pensa coisas que mais ninguém alcança, e continuar a gostar dele como escritor, reforça a ideia de que a literatura ainda é um luxo e que o pensamento pode ser apenas uma solução de recurso da pelintragem.
Lembro-me sempre da frase de Fernando Pessoa (R.R.) que ele recolhe no início do “Ano na Morte de Ricardo Reis” : “Sábio é o que se contenta com o espectáculo do mundo”.
E fica-me agora esta dúvida de natureza estatística: haverá mais aforismos para “sábio” ou para “palerma”?
Todas as palavras podem ter a sua magia. Mas nem todas curam os males do mundo.
# posted by antonio @ 00:11"
domingo, março 28
primeiro verso
era uma qualquer tarde
testemunhas da alegria
sexta-feira, março 26
dizes-me adeus e eu não sei que dizer
jon longhurst
quinta-feira, março 25
obviamente, demito-o
manuel joão vieira, candidato a candidato a presidente da república, na sic notícias, falando de durão barroso. por entre "é preciso dar outra realidade aos portugueses", "é preciso fazer de cada português um artista" e uma garrafa de teor alcoólico.
"eu luto sempre do outro lado da luta..."
na oração, com cânticos de taizé
"todos os caminhos de deus são de amor"
quarta-feira, março 24
pergunta-me outra vez, não percebi
layfon ching
à espera de deus
phyllis redman
domingo, março 21
silêncio
queria dizer-te apenas silêncio. com palavras em forma de olhares. e gestos no lugar último do texto. sem pontos finais nem vírgulas. apenas um imenso espaço em branco.
quinta-feira, março 18
uma pergunta estúpida
queres vir comigo?
terça-feira, março 16
mudança
respiro o ar quente. o inverno vai lentamente permitindo que a avenida sorria. as crianças rompem o silêncio. as flores enganam a noite. nascem sem querer no lado obscuro dos dias.
lady
danço. pela noite fora. como se tudo durasse apenas um instante. e a vida se resumisse a duas ou três verdades que não me apetece conhecer.
segunda-feira, março 15
primeiro dia
hoje é o primeiro dia da primavera. ouço claramente os pássaros e os raios de sol a derramar vida na terra. mas não tenho vontade de partir. de ir em busca da água. ou da vida.
sexta-feira, março 12
o cordeiro de deus
quando entrei na sala havia uma alegria e uma agitação de quem está prestes a concluir uma ansiosa espera. havia freiras, seminaristas, membros da opus dei (não me peçam para explicar como o soube), grupos de amigos, famílias. parecia um bar ou uma sala de convívio. o filme começou e o silêncio impôs-se até às primeiras e absurdas cenas em que as pessoas riram. a partir da tortura de jesus pelos soldados romanos uma mulher começou a chorar compulsivamente até ao final, sendo a excepção a um silêncio demasiado pesado. constrangedor. não acho que o filme seja mais violento do que outras coisas a que hoje temos acesso. acho-o sim profundamente chocante. uma surpresa em forma de choque. no fundo, uma história que todos sabem de cor mas que nunca viram em tão estilizado realismo. e a questão é essa. a paixão de cristo não é mais do que um filme que me mostra o que eu nunca sequer podia ter imaginado acerca do sofrimento humano.
em termos construtivos, há um profundo fosso entre as personagens centrais e as manobras de diversão que gibson enxerta na narrativa e uma péssima realização no que toca à transição entre o presente e os momentos de flashback. não há qualquer espécie de apelo ou sugestão anti-semita. jesus tem um nariz perfeitamente judaico. bolas, ele era judeu! aliás, quem vir o filme sabe que se existir um contraponto a jesus não são os judeus ou os romanos mas outra coisa que gibson sugere.
sustive a respiração demasiadas vezes. pensei o que estava ali a fazer, lembrando-me do que hoje tinha ouvido nas notícias. no dia do massacre de madrid assisti a uma encenação de outro massacre. de um cordeiro que diz a certa altura a sua mãe "eu renovo todas as coisas", carregando o peso de um mundo injusto e cruel. e lembrei-me infinitamente pela noite dentro das palavras de ruy belo:
"a primeira infância passou mas agora ou logo
deus renova todas as coisas
e um dia haverá barcos e seremos livres"
um dia também serei livre. e não morrerão inocentes. nunca mais.
quarta-feira, março 10
amanhã vou ver a paixão de cristo
hoje ouço na sic notícias a representante da comunidade israelita de lisboa escandalizada com o facto das feições dos actores serem claramente judaicas (nariz afilado, etc) excepto jesus. mais. a senhora receia sobretudo o impacto que o filme possa ter nas comunidades islâmicas da europa ocidental (?!?!). eu que nunca senti qualquer espécie de anti-semitismo começo a vislumbrar a razão porque existem ideias estruturalmente recalcadas que não podem deixar de o ser com pessoas responsáveis que não sabem o que dizem.
mas que se sentem perseguidas. e disso lavo as minhas mãos. não há povos nem pessoas deicidas. deus é aquilo que é.
porquê?
pedido
peço-te que nunca me traias. que me defendas sempre da noite. é demasiado?
monólogo
achas que posso ver um pouco a vida a passar enquanto dormes? escolho o silêncio ou o rumor?
terça-feira, março 9
distância
sou um mau amigo, eu sei. tenho vergonha de admitir que sinto a vossa falta. daí o meu silêncio. demasiado constante. recorrente. embaraçoso.
à margem da história 6
mesmo que eu lesse todos os livros de história, nada saberia de história sem ouvir os mestres.
não por uma questão de vassalagem. falo apenas de humildade.
à memória de ruy belo
"Provavelmente já te encontrarás à vontade
entre os anjos e, com esse sorriso onde a infância
tomava sempre o comboio para as férias grandes,
já terás feito amigos, sem saudades dos dias
onde passaste quase anónimo e leve
como o vento da praia e a rapariga de Cambridge,
que não deu por ti, ou se deu era de Vila do Conde.
A morte como a sede sempre te foi próxima,
sempre a vi a teu lado, em cada encontro nosso
ela ali estava, um pouco distraída, é certo,
mas estava, como estava o mar e a alegria
ou a chuva nos versos da tua juventude.
Só não esperava tão cedo vê-la assim, na quarta
página de um jornal trazido pelo vento,
nesse agosto de Caldelas, no calor do meio-dia,
jornal onde em primeira página também vinha
a promoção de um militar a general,
ou talvez dois, ou três, ou quatro, já não sei:
isto de militares custa a distingui-los,
feitos em forma como os galos de Barcelos,
igualmente bravos, igualmente inúteis,
passeando de cu melancólico pelas ruas
a saudade e a sífilis de um império,
e tão inimigos todos daquela festa
que em ti, em mim, e nas dunas principia.
Consola-me ao menos a ideia de te haverem
deixado em paz na morte; ninguém na assembleia
da república fingiu que te lera os versos,
ninguém, cheio de piedade por si próprio,
propôs funerais nacionais ou, a título póstumo,
te quis fazer visconde, cavaleiro, comendador,
qualquer coisa assim para estrumar os campos.
Eles não deram por ti, e a culpa é tua,
foste sempre discreto (até mesmo na morte),
não mandaste à merda o país, nem nenhum ministro,
não chateaste ninguém, nem sequer a tua lavadeira,
e foste a enterrar numa aldeia que não sei
onde fica, mas seja onde for será a tua.
Agrada-me que tudo assim fosse, e agora
que começaste a fazer corpo com a terra
a única evidência é crescer para o sol."
eugénio de andrade (1978)
domingo, março 7
quanto tempo temos ainda?
poema
uma amiga transcreve um poema que vale a pena ler.
despedida
ouço neste momento a última hora de emissão da voxx. é tempo de despedida, portanto. tempo da publicidade, das playlists, dos mega-almoços, das rádios só com grandes músicas.